quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Como posso ser feliz?

Todas essas tragédias que acontecem no nosso país me fazem lembrar de quando eu era criança, minha mãe costumava cantar para mim na hora de dormir:



"Para mim a chuva no telhado
É cantiga de ninar
Mas o pobre meu Irmão
Para ele a chuva fria
Vai entrando em seu barraco
E faz lama pelo chão...

Como posso ser feliz
Se ao pobre meu Irmão
Eu fechei meu coração
Meu amor eu recusei...

Para mim o vento que assovia
É noturna melodia
Mas o pobre meu irmão
Ouve o vento angustiado
Pois o vento, esse malvado
Lhe desmancha o barracão...

Como posso ser feliz
Se ao pobre meu Irmão
Eu fechei meu coração
Meu amor eu recusei..."

sábado, 15 de janeiro de 2011

Acorde

Você sempre responde o que eu não quero saber. Sempre me indaga, me aperta, me avisa, me recheia de medos e agonias, me importa, se exporta, me faz sem querer.

Você me enche de mato nas frestas, de poeira nas dobras, de loucura nas sobras, de orvalho nas metas. Você me traz o torpor das mãos distantes que tocam a tela e da voz vazia que diz que, mais tarde, mais tarde vai voltar.

Você faz o peito pesar ao ponto de meus olhos arrastarem-se no chão sem direção. Meu soluço, minha falta de voz, e meu estômago roncando a vontade que flutua nesse oceano de injustiça.

Você me aninha nessa vontade de calar a boca e puxar o cabelo da eloquência com que cospes tanta doçura mastigando o meu freio de viver. Cordas que se enroscam e nada mais podem produzir do que nosso acorde.


sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

O dia em que voltei a escrever

Não fazia sol, não soprava o vento. Os pássaros não cantavam, as árvores não mexiam. Tudo era pressa, tudo era o barulho infernal da obra que não me deixava sossegar. O calor explodia, os carros batiam, o caminho para casa parecia nunca terminar.

Ninguém sorria nesse dia mágico. O mundo estava doente e, de vida, quase nenhuma notícia chegava. As flores começavam a murchar e a água não caia do céu para refrescar nossa impaciência.

Era um tempo de urgência, de talvez até demência, de jogos enfadonhos e nenhuma Georgia on my mind. Era uma risada abafada de uma balbúrdia que era o fim da picada, era o relatório tão chato de se completar.

Mas as palavras voavam da minha boca, e notas, mais notas de números de notas que quase esqueci florearam o desenho que balbuciei naquela língua que não entendem vocês. E foi aí, então, que voltei a escrever.